OUÇA: faye webster || better distractions
Foi tudo muito rápido.
Um relance e um
instante.
Um momento.
Ele pegou um
cigarro no bolso do casaco, acendeu-o rapidamente, deu uma tragada profunda e
tentou olhar do outro lado da rua para ter certeza do que estava vendo.
Não quis crer no
que imaginou ter testemunhado acontecer do outro lado da rua.
Um casal.
Uma mulher e um
homem.
Juntos.
Mãos dadas e aparentemente
sorrindo.
Aparentemente
não, eles estavam mesmo sorrindo.
Não. Acho que
não – ele pensou enquanto
tentava observar melhor aquela cena que o despertou.
O Clube Varsóvia
não estava muito cheio naquela quinta-feira, mas no meio da pequena multidão
esperando para entrar, algo chamou a sua atenção.
Algo que ele não
queria ter visto e, no mesmo instante em que viu e se deu conta, desejou não
ser realmente verdade.
Ele ficou parado
em frente ao bar do outro lado da rua do Clube Varsóvia, tragando o seu cigarro
e tentando ter a certeza do que estava vendo.
Precisava ser
rápido, pois eles já estavam quase entrando no Clube.
Não. Acho que
não. Não pode ser, porra
– ele pensou novamente, enquanto tentava observar de mais perto aquela cena
específica no meio da pequena multidão. Maldita lente de contato que eu não comprei.
Imbecil – ele pensou, lamentando ter feito o que sempre fazia: deixar as
coisas para depois, até ser tarde demais.
Os cabelos da
garota eram bastante vermelhos e quase da mesma tonalidade que ele sabia que
jamais iria conseguir esquecer.
A altura dela
era praticamente a mesma, mas o fato de estar de costas dificultava a certeza
do que e quem ele estava efetivamente vendo.
Não. Ela não
faria isso comigo e viria até aqui – ele
pensou com certa indignação e esperança em (talvez) estar certo.
Ela sabe que
eu sempre venho aqui –
pensou com mágoa e uma ponta de indignação.
E, então, os
cabelos vermelhos do outro lado da rua moveram-se rápido e sem prévio aviso e
aquele casal do outro lado da rua entrelaçou braços e abraços e começou um
beijo.
Um beijo, mas um
“bastante beijo”.
Um beijo de
verdade.
Ele deu mais uma
tragada no cigarro, ainda sem a certeza do que estava vendo e de quem se
tratava.
Não, ele não
tinha mesmo a certeza de quem efetivamente estava sob a mira dos seus olhos, mas
dificilmente poderia estar enganado.
Dificilmente.
Porra, mas
ela não me avisou que tinha voltado –
ele pensou com uma dose relevante de tristeza e raiva.
Não me avisou
e voltou. Assim, do nada –
Continuou.
Deu uma nova tragada
no cigarro que agora estava quase no fim.
- Cadu? – uma voz
doce atrás dele soou rápida e interrompeu aquele momento de tormento que ele
experimentava.
Ele virou e ao
perceber de quem se tratava, sorriu tentando disfarçar a surpresa.
E, sem convicção
em querer agradar, apenas disse – Estela. Uau. Olha você. Depois de tanto tempo.
Que linda.
Ela sorriu e
respondeu provocativa – Ora, ora, finalmente você me notou e notou o óbvio.
Fico feliz.
Ele sorriu de
volta sem graça.
Ela continuou –
Então, como são as coisas, não? Desde que ela viajou eu não te vejo. Faz tanto
tempo, né?
Ele olhou para
baixo sem graça e respondeu - Sim. Bastante. Mais do que a gente pensa, não?
- Sem dúvida –
ela concordou.
- Você vai
entrar no Varsóvia? – ele perguntou, desviando o olhar mais uma vez, ansioso em
tentar saber se aquele casal ainda estava do lado de fora do Clube.
Ela percebeu o
movimento dele e respondeu – Olha, eu até ia sabe? Estou esperando a Lu, mas
depois dessa surpresa boa em te reencontrar, pensei se a gente não podia tomar
alguma coisa e bater papo em algum outro lugar. Variar né? Descobrir algo além
do famoso Clube Varsóvia. O “nosso” Clube Varsóvia.
Ele a olhou em
silêncio.
- Ah, você
precisa se distrair. Precisa de distrações melhores. Algo me sugere que você
está saindo pouco desde, bem, desde há algum tempo. Não me parece muito feliz.
Vamos lá. Outro endereço. Outra vida. Vamos embora.
Ele a olhou com
espanto e disse reticente e sem saber exatamente o que fazer – Mas, e a Lu?
Ela com um
brilho no olhar emendou de volta - Ainda bem que existe WhatsApp não?
Ainda bem. Eu aviso a ela onde eu vou te levar para que ela saiba que não deve
ir até lá – brincou com um sorriso e continuou - Então, vamos? A noite acaba de
começar – ela disse e decretou enquanto segurava as suas mãos e o puxava
suavemente de canto, conduzindo-o no sentido contrário ao do Clube Varsóvia.
Ele ficou sem
reação e concordou com o olhar e com um movimento sem graça.
Enquanto afastavam-se
em direção ao carro de Estela, ele virou a cabeça da forma mais discreta
possível, ainda mais uma vez, percebendo não haver mais casal algum se beijando
em frente ao Clube.
Casal algum.
Não. Acho que
não – ele pensou aflito enquanto
tentava voltar o seu olhar à sua frente ou em direção à Estela que estava ao
seu lado.
Não. Com
certeza, não – ele insistiu
novamente em pensamento, apenas tentando esquecer aquela cena que ele havia
visto e que esperava não lembrar na manhã seguinte.
Não. Acho
que não – continuou a
pensar.
Sem saber.
Apenas sem
saber, mas tendo certeza.
Triste certeza.
Photo by Philipp K. from FreeImages
Comentários