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Te conheço, não é? – ele perguntou de modo suave e alegre, logo atrás daquela
garota alta de cabelos castanhos à sua frente na fila do balcão do bar.
Três
da madrugada e a fila do balcão do bar do Clube Varsóvia era o lugar a não se
estar, seja pelo excesso de gente, seja pelo excesso de sede.
Calor
na madrugada de quinta-feira.
Ela
parou a conversa com sua amiga e virou apenas um pouco a sua cabeça, desviando
o olhar apenas o mínimo necessário para observá-lo. Sem nem um sorriso ou simpatia,
respondeu direta – Não.
Ele
a olhou com certa surpresa e retrucou – Não? Mas você sequer me olhou direito.
Não prestou atenção, fala a verdade – ele afirmou querendo ser simpático.
Ela
virou mais uma vez e o olhou com atenção. Dessa vez, fez de tal forma que ele realmente
percebesse que ela o observou com cuidado e disse novamente – Não. Não te
conheço – sentenciou.
Ele
não desistiu do sorriso e disse – Ah, talvez seja por causa do horário, né? Já
está tarde e com o Clube Varsóvia tão cheio hoje, você já deve ter bebido várias
vodcas. Bem, sem querer ser indelicado, mas é o que moças bonitas como você
fazem aqui no Varsóvia – completou com um sorriso doce.
Ela
não achou muita graça no comentário e respondeu – Eu só bebo água com gás. Quer
checar minha comanda? – disse ríspida.
Ele
a olhou com ainda mais um sorriso franco e emendou – Melhor ainda. Adoro água
com gás. Vai ver é daí que te conheço.
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Não, não deve ser. Provavelmente eu me lembraria – ela disse, olhando para ele
agora com curiosidade.
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Bem, então da onde deve ser? – ele perguntou, sentindo uma esperança no ar.
Ela
o encarou sem paciência, pois o breve momento de chance que ele teve com ela passou,
veloz como veio e disse- De lugar nenhum, com certeza. Nunca te vi. Espero que
encontre quem procura – finalizou, virando novamente para o bar.
Ele
desistiu do sorriso e fez um gesto ondulado e cordial de despedida com as mãos
e disse – “C'est la vie, belle Mademoiselle. C'est la vie”.
E
partiu em direção à pista.
Ao
ouvir aquela frase, em francês perfeito, ela assustou.
Sentiu
a sua nuca rígida e percebeu como ficou arrepiada.
Como
um toque de mágica.
Algo
que ela viveu sem lembrar.
Mágica.
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Vai querer o que? – o som de uma voz grossa e cansada invadiu os seus ouvidos e
ela, finalmente, percebeu que chegou a vez de pedir a sua água com gás.
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Uma vodca, por favor – pediu ao bartender.
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Vodca Sophie? Vodca? – Não ia beber água? – disse Carol, a amiga que estava ao
seu lado e testemunhou a cena.
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Não – respondeu distante, olhando para trás e procurando aquele sujeito que
estava logo atrás dela.
Carol
a olhou estranha e disse – O que houve? Você conhece aquele cara, afinal?
Ela
tremeu ao lembrar daquela voz, daquele tom e sentiu saudade de algo que não viveu.
Em
tom desconcertado respondeu – Não. Claro que não. É alguma cantada barata.
Vamos dançar?
E
enquanto ela dançava com Carol e os seus olhos viajavam pelo Clube em vão, à procura
de alguém que não mais estava lá, ela apenas pensou – Não. Deixa de ser boba. Não
pode ser. Claro que não. Claro que não.
E
não sorriu, quase chorou.
E
quem, além do nosso coração, pode garantir que sentimos o que sentimos, não é
mesmo?
Quem?
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