O suor escorria pela sua testa. Intenso. Vivo. Gotas nada discretas e insistentes teimavam em escapar por entre os espaços formados entre a sua touca de mergulho e os seus cabelos (mal) presos. A plataforma era alta. Bastante alta. Altura suficiente para dar medo. Algum medo. E o suor? Bem, por enquanto ele continuaria por lá, lutando contra a teia de silicone de sua touca. Desistiu de pensar nisso. Ela nem se importava mais. Sabia que deveria prestar atenção na técnica, leveza, plasticidade e flexibilidade que não teve, por exemplo, ao longo do seu relacionamento com ele, ao longo de todo o tempo que estiveram juntos. Todo aquele tempo que simplesmente derreteu por um desacerto aqui, um desencontro ali, ou o que quer tenha acontecido entre eles. Todo aquele tempo tão cheio de tudo e que agora, há pouco, virou nada. Quase nada. Queria esquecer. Porra, isso não é hora de lembrar dele – ela pensou com aflição. Voltou ao suor. O suor que deslizava pela testa. Um baile não planejado riscando o seu rosto. Gotas ainda menos discretas e muito mais que insistentes. Alta. A plataforma era alta. Bastante alta, bastante o suficiente para qualquer coisa, qualquer salto, qualquer coreografia aérea que ela desejasse experimentar. Lágrimas? Bem, as lágrimas eram mais insistentes que o suor e tão inevitáveis como os pensamentos que ela queria afastar. Mas tudo estava lá. Claro. Tudo junto e ao mesmo tempo, fazendo companhia a ela sobre a plataforma naquela manhã de domingo. Uma manhã de domingo diante de desconhecidos desimportantes que não sabiam absolutamente nada sobre o que ela pensava ou como ela se sentia. Não fazia diferença alguma. O que ela, plateia, precisava saber era apenas e tão somente se haveria um salto preciso ou não. Nada mais. O que ela, coração partido, precisava mesmo fazer era esquecer o suor que continuava a escorrer pela sua pele diáfana. E assim, tensa, ela respirou fundo. Como em um improviso do destino, inesperado, algo a fez virar o olhar para o público e, porra, ele estava lá. Na plateia. Não – ela pensou. Ele estava lá. Ele estava na plateia que agora já não era mais desimportante. Não. Não era. Ele estava lá. Lindo e com um sorriso aberto, olhando em sua direção e, conforme ela notou, com os dedos cruzados. Não. Ele não devia estar aqui – ela lamentou – Devia? – questionou por um segundo. O suor escorreu ainda mais uma vez por sua testa quando ela lembrou que a plataforma era alta. Bastante alta. Alta o suficiente para qualquer salto, qualquer acrobacia, enfim para o que ela quisesse ser ou fazer em poucos segundos de voo. E então ela respirou.
Respirou fundo e assim o fez: saltou, voou, coreografou, dançou, sorriu e caiu. Linda, leve e doce. Perfeita.
E ela mal sentiu quando a água gelada correu rasgando em contato com o seu corpo. Apenas afundou. Afundou o suficiente e o bastante. O necessário. A água da piscina roubou as lágrimas e quando ela voltou à superfície, feliz, percebeu de imediato que ele ainda estava lá. De pé e aplaudindo. Lindo e com um sorriso largo e franco no rosto. Dedos não mais cruzados e somente um maço de flores embaixo do braço. O suor frio escorreu ainda mais uma vez por sua testa. Finalmente, ele venceu o silicone da touca. Mas, nada disso era mais importante naquele instante. Nada. O que importava de fato, era apenas a vontade que ela tinha em sair da água e tentar de novo. Tentar de novo ainda mais um salto. Tentar de novo, ainda mais uma vez, o que poderia voltar a viver.
E assim, tentou sorriu.
E sorriu.
Feliz.
Ornamental.
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