Pular para o conteúdo principal

NOSSO SUOR SE MISTUROU DEMAIS...



- Nosso suor, se misturou demais... – ela cantarolou baixinho. Bem baixinho, emitindo sinais, mas não de propósito.

Ele ouviu e respondeu de pronto – Música antiga, hein? Está ficando saudosa ou velha mesmo? – perguntou grosso, tosco, otário, como sempre fez, sem desviar os olhos do seu jornal.

Ela apenas sorriu. Sabia que ele não era assim. Ele apenas se fazia – e gostava muito disso - de filho da puta.

- Canção antiga. Vintage total. Vintage total. Mas vintage tá na moda , não é mesmo? – ele emendou – Veja o bando de velhos ouvindo discos de vinil por aí.

- Você é um babaca – ela respondeu.

Ele apenas sorriu. Tinha certeza disso.

- Nosso suor, se misturou demais... – ela cantarolou novamente. Desta vez não tão baixinho, não tão tímida. Não tão baixinho, nem um pouco tímida. Forte. Segura. Decidida. Sabia o queira, mas não achava o alvo.

- Também acho – ele concordou, fechando o jornal com média força e suspirando forte – E não sei exatamente o que fazer. Definitivamente não sei o que fazer.

- Sobre...? – ela perguntou sonsa.

Ele sorriu e respondeu rápido e irônico e muito, mas muito, idiota – Sobre como tirar a tinta do jornal dos meus dedos – disse, sorrindo seu sorriso mais cínico.

- Você me ama? – ela perguntou.

Ele abaixou a cabeça.

- Não? – ela repetiu, já sabendo a resposta.

Ele levantou-se da sua confortável cadeira de veludo azul, toda antiga e toda rasgada e toda pobre e foi à cozinha. Cozinha pequena, barata, vagabunda, assim como todo o seu apartamento no centro daquela maldita cidade. Encheu o seu copo americano (copo de requeijão, né?) de vodka barata e esperança e coragem. Voltou à sala.

Acendeu um cigarro mentolado meio sem jeito - Bem. O que você cantava? – ele insistiu e perguntou de forma besta e desmiolada.

Ela o encarou como se ele fosse um idiota. E, de fato, ele o era. Um verdadeiro e infantil e grande e gordo idiota. E ela sabia. Ela sabia disso desde o primeiro dia em que o viu no Clube Varsóvia. Um tolo. Pobre tolo.

- Você acha que eu sou uma imbecil? – ela perguntou de forma afiada.

Ele tomou um gole gordo de sua vodka e nada disse.

- Acha? – ela insistiu.

Ele a encarou e respondeu direto – Claro que não. Nunca.

Ela sorriu tímida e pegou o copo dele das suas mãos longas e finas. Tomou um gole rápido da sua vodka vagabunda.

- Sabe o que eu acho? – ele perguntou.

Ela balançou a cabeça e ficou em silêncio.

- Que é excelente a mistura de nosso suor. De verdade. Do fundo do coração.

Ela sorriu, acendeu um Marlboro e começou a chorar. Muito. Culpada, nervosa, triste e confusa.



... simplesmente não sabia como dizer a ele que o suor não era necessariamente dele...



Definitivamente não sabia o que dizer.



...definitivamente...


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Você

leia e ouça: U2 | bad Você. Você é intensa demais, e eu a amo. Muito. Você. Sim, você mesmo, você sabe a quem me refiro: VOCÊ! Você tem os cabelos mais desgrenhados, bagunçados e divertidos do mundo. E eu amo. Você. Cada detalhe, cada aroma, cada toque, cada TUDO. Nós. Tem os olhos mais verdes do mundo, e eu a amo. Amo. Amo você. Minha esmeralda. Minha pequena. Minha mãozinha guia. Você. Você. Apenas você! A mulher que mais merece ser cafuneada no universo, na galáxia, em tudo. Toda hora, todo dia, todo tempo. Você. Eu a amo. Você. Você mesmo. Tem força, tem garra, tem voz, tem presença, tem vida, tem alegria, tem coerência, tem sorriso, tem empatia, simpatia, tem tudo. Pequena, mas gigante. Você. Eu sou muito honrado de receber e dar seus super likes . Te laqueio todo dia, toda hora. Você é simplesmente essencial, especial, única. Você… simplesmente e unicamente VOCÊ existe para mim. Nada mais. Mais ninguém, E por mais burrices que eu faça, que eu repita, que eu erre, imbecil que so...

Going Down

leia e ouça: lou reed || going down “... Time's not what it seems. It just seems longer, when you're lonely in this world. Everything, it seems, Would be brighter if your nights were spent with some girl Yeah, you're falling all around. Yeah, you're crashing upside down. Oh, oh, and you know you're going down For the last time …” Lou Reed || Going Down E o sonho avançava. Apenas avançava. A noite tinha apenas começado. … - Ei mocinha. Mocinha? Me ouve? Ela chacoalhou os cabelos castanhos desgrenhados, um monte de nós sem sentido, apenas ela, virou o rosto confuso e encarou aquele sujeito grande, intimidador, com cara de bravo e que estava imóvel à sua frente, um verdadeiro brusco naquele cenário. - Então, me ouve? Está me ouvindo? - aquele grandalhão insistiu - Me ouve, porra? - disse, de modo grosseiro. Ela olhou com um tanto de medo e sem saber exatamente o que fazer, o que dizer, o que mexer, o que responder, nada disse. Apenas, nada disse. - Você entende? É surd...

PARTINDO (LOSING MY RELIGION)

  OUÇA: clelia vega || losing my religion Life is bigger** It's bigger than you Era um trem extremamente velho. Muito mesmo. Um trem como tantos outros que poderia servir muito bem como cenário para tantos filmes com roteiros passados em épocas antigas. Trem antigo com estilo e um mistério noir não mais usual hoje em dia. Bem, era apenas um trem e ele estava dentro dele, passageiro e sem companhia.   And you are not me The lengths that I will go to The distance in your eyes Oh no I've said too much I set it up.   Ele observava através da janela e percebia a paisagem que corria acelerada lá fora. Uma paisagem cinza como chumbo e decorada com um chão úmido pela fina e interminável chuva que não se cansava de cair. Estava muito frio lá fora. Muito.   That's me in the corner That's me in the spotlight Losing my religion Trying to keep up with you And I don't know if I can do it   Por um instante, ele pensou que não era só a paisagem que corria l...

MÚSICAS, CANÇÕES OU... TANTO FAZ...

Músicas? Canções? Tanto faz. Às vezes é uma coisa. Às vezes outra. O inverso. Mas, tanto faz. Tanto faz. Com erro de português ou não. Com lágrimas... ... ou não. E ela? O adorava. Muito. Mesmo sabendo do seu ridículo gosto por música pop. Música para um babaca dançar. Nada demais. Músicas? Canções? Tanto faz. Às vezes é uma coisa. Às vezes outra. Com lágrimas... ... Ou não. Ou não... - E você? – ela perguntou. Ele fez apenas uma cara de surpresa – Como? - respondeu. - E você? Já ouviu True? Ele a olhou com espanto e surpresa. - Spandau Ballet? Ela sorriu. Ele também. - Ouviu? – ela prosseguiu. - Idiota – ele respondeu de forma grossa. Ela apenas sorriu. Sabia quem era ele. Sabia mesmo. Mesmo depois de tantos e tantos anos. Tantos anos... Tantos anos...

Quando Você Ama…

  leia e ouça: surf curse || freaks “...Don't kill me just help me run away From everyone I need a place to stay Where I can cover up my face Don't cry, I am just a freak I am just a freak I am just a freak I am just a freak…” (Surf Curse || Freaks) Quando você vive, você erra. Todos nós. Todos. Todos nós erramos, de um jeito ou de outro. Faz parte. Quem nunca errou? Quem nunca? Só quem não viveu. Quando você vive, você se expõe e acaba errando, cedo ou tarde. Mente quem diz que nunca errou, uma vez que certamente também errou em algum momento da vida e tenta negar isso. Eu? Se eu errei, omiti e menti? Sim. Certamente. Muito. Mais do que seria razoável, muito mais do que seria razoável. E só os Deuses sabem como foi difícil e errado e como me arrependo. Arrependimento? Muito. Arrependimento real e verdadeiro. Mas, a verdade é o mais importante. Sempre. E demorei a entender isso. Demorei MUITO. Muita porrada para entender isso. Muita porrada para entender isso. A transparência. ...