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Mostrando postagens de março, 2005
AZULEJOS LÍQUIDOS One pill makes you larger And one pill makes you small, And the ones that mother gives you Don't do anything at all. (white rabbit - jefferson airplane - 1967) Aquele lugar parecia uma cozinha antiga, anos cinqüenta. As paredes eram forradas de azulejos brancos. Inteiramente forradas. Do teto ao chão. Ele parecia não acreditar. Seus sentidos estavam atormentados, inchados, cansados, tontos. O suor escorria pela testa em gotas gordas, cheias de desejos. O único cenário imutável era o composto pelos azulejos. Seu corpo derretia em cascatas coloridas. Sua pele parecia querer esconder as marcas. Todas as marcas de cortes, provocadas nos momentos de dor. Não havia cor nas paredes azulejadas. A cor estava no seu corpo. Cores desbotadas, cores vivas, cores mortas. Ele queria correr para algum lugar longe dali. Algum lugar muito longe daquele espetáculo de caos e desordem. Nada estava no lugar. Mas, porra, não havia nada para estar arrumado. Ele estava só, nu, no meio de
SURPRESAS INDESEJÁVEIS Nada pode ser tão simples assim. Nada. Nada pode ser tão simples e tão fácil. A vida não é fácil, mas nem fodendo. Quem diz isso ou está com febre ou drogado ou bêbado ou é apenas imbecil. A vida não é, simplesmente, como nós a imaginamos. Digo sobre a vida que desejamos ter. A vida que imaginamos querer. A fumaça que escorre entre os dedos é a fumaça das horas, dos minutos e dos segundos que passam, cruéis, enquanto aguardamos a porra do fim. Os letreiros finais. O começo dos créditos. A trilha sonora. Não importa quantos cigarros ou quantos beijos ou quantos gozos ou quantos copos. Simplesmente não importa. A vida não é, definitivamente, como nós imaginamos. Caralho, dependemos de outros, não só de nós. E é aí que tudo fode. É aí que tudo vai para o espaço. A vida poderia ser um jogo virtual, uma espécie de Pac-Man do avesso, sob nosso total controle. Apenas diversão. Just for fun. Mas a cama em que ela acorda não é cama em que ela quer acordar. A bebida que el
DEAD FLOWERS - O que não te deixa envelhecer por completo é a música. Música. A única coisa que, talvez, você ame de verdade. A única coisa que, talvez, você respeite de modo sincero. A única coisa que, talvez, você queira por perto. De resto, porra, de resto, você é um idiota insensível. Uma flor morta. Entende? Sem brilho, sem cor, sem perfume, sem vida, sem nada, enfim, apenas uma flor morta. Um playback insano e constante e repetitivo. Insuportável. Verdadeiramente insuportável. As palavras doíam em sua cabeça. Muito. Soavam como um martelo pesado e enferrujado. Tenso. Cada tônica parecia querer perfurar a sua tez até fazer o sangue jorrar e jorrar e jorrar. E a noite já estava morrendo. O sol insistia em querer nascer. Em querer atormentar aqueles que se alimentam (se escondem?) da escuridão, do silêncio, do vazio, da deliciosa ausência de pessoas e convívios. As palavras não deixavam a sua cabeça. Ele apenas olhava através da janela a noite morrer. Um bando de idiotas e azarados
GUARDANAPOS E QUEBRA-CABEÇAS - Tudo parece tão irreal, você não acha? – ela perguntou a ele, enquanto brincava com os dedos e uma caneta no seu guardanapo, todo sujo de batom. - Como assim? – ele questionou, sem saber se não estava entendendo a pergunta por causa do sono, por causa das altas doses de tequila ingeridas ou, simplesmente, porque não fazia a menor questão de entendê-la. - Parece papo de adolescente babaca, carente, mas é apenas irreal. É estranha esta falta do que ter a dizer para você. Mesmo depois de todo este tempo. Ele continuou sem entender, mas, no fundo, já sabia o que ela estava tentando dizer. - Anos e anos e anos que estamos juntos... - ... que anos e anos? Estamos juntos há dois anos apenas, não? – ele interrompeu sem a menor sensibilidade e cerimônia. Ela respirou fundo, irritadíssima e entediada, e continuou, ignorando o comentário inoportuno que ele havia feito - ... anos e anos e anos que estamos juntos e parecemos tão distantes. Cada dia mais. Cada maldito
ÁLBUNS DE FOTOGRAFIAS E RUAS ERRADAS - Não acredito! - ele disse, verdadeiramente surpreso, meio alegre, meio constrangido. Ela olhou-o como se mal pudesse acreditar que fosse ele. Viu primeiro um fantasma do passado, um espectro, assombração. Um sonho. Um pesadelo. Ela disfarçou e apenas sorriu. - Estela? Estela? Ah, não creio. Quantos anos menina... - ele relembrou, aproximando-se para lhe dar um abraço carinhoso. - Oi Edu. Muito tempo, né? - ela respondeu com a pergunta, permitindo o abraço e sentindo o calor daquele corpo tão estranho, tão conhecido. Ele concordou com a cabeça - Mais tempo do que jamais pensamos que fosse nos separar. Muito mais tempo mesmo - ele afirmou, deixando a tristeza escapar, breve, por entre os dentes, por entre as vogais. - Como você está? - ela perguntou, agora interessada, sincera. Ele pensou antes de responder. Não muito, mas pensou sim - Bem. Estou bem - disse. - Dá para ver - ela concordou - Não parece tão detonado - sorriu - Ainda é um belo homem -