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- Ei? Aqui. Olhe aqui, garoto triste – ela disse de um jeito abrupto, porém carinhoso e suave – Olhe aqui – insistiu com um sorriso entre os lábios, um sorriso amigável e amável.
Doce, terrivelmente doce.
Típico dela.
Ele virou o seu corpo de súbito e a olhou rapidamente.
Pego de surpresa por ela, ainda mais uma vez.
- Bah – resmungou e virou o rosto ao perceber a câmera - Deixa disso, porra – disse contrariado e irritado, mais pela situação e menos por odiar ser fotografado por ela.
Ela?
Ela adorava fotografar.
Adorava fotografar tudo o que fosse possível.
Tudo.
Ela adorava fotografar cenários, paisagens, flores, praias, enfim, qualquer coisa interessante ou não, atraente ou não. Ela adorava fotografias e, dentre todas as coisas, o que ela mais adorava eram as fotografias de pessoas.
Exato, pessoas.
Gente de verdade.
Pessoas com sorrisos, lágrimas e tudo mais.
Gente. Somente isso.
Porém, nunca através de celulares idiotas.
Não. Nunca.
Ela adorava fotografar de verdade.
Era uma das coisas que fazia de melhor.
- Vira, vai – ela insistiu na tentativa de amenizar o que não podia, porém ele permaneceu com o rosto virado, fora do foco.
Fora de foco.
Fora do alcance da lente dela.
Ela pôs a câmera de lado e se aproximou com cuidado.
Tocou de leve nos ombros dele e fez um carinho breve em seu cabelo quase longo e todo solto.
Percebeu nele as lágrimas que não podia ver e a respiração contida que podia ouvir.
Sabia o que havia.
Sabia exatamente o que estava acontecendo naquele saguão de aeroporto tão impessoal e repleto de gente.
Ela entrelaçou os seus braços finos e tatuados a partir das costas largas dele e encostou com carinho, podendo sentir o perfume adorável flutuando do seu cabelo e de sua nuca.
O perfume dele.
E prometeu a si mesma nunca esquecer aquele aroma e aquela noite e aquele saguão de aeroporto tão bipolar, cheio de alegria para uns e melancolia para outros.
- Você vai mesmo, certo? – ele perguntou sem realmente querer saber a resposta e continuou - Sem fotos, por favor. Depois você me manda as suas de lá, se quiser. Mas agora não quero fotos de nada – disse com ela colada às suas costas, ambos em silêncio.
- Você precisa ir – ele concluiu.
Ela nada disse e apenas o abraçou ainda mais.
Não insistiu em nada e ele permaneceu com o rosto virado, afogado em lágrimas contidas e desesperadas em não serem vistas.
Fora de foco.
Fora do alcance da lente dela.
Fora do alcance dela.
Fora do alcance dele.
Apenas um retrato para quem via de fora.
Apenas a vida deles sentida por dentro.
O que não é quase nada para muitos, mas muito para eles.
Apenas a vida deles.





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NUCA

Ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. Muito feliz. Não existiam mais as más notícias. Não. Definitivamente não. Sem contas, protestos, cobranças ou ligações indesejadas. Nada. Nada a perturbar. Existiam apenas os lábios de Fernanda em sua nuca. Lábios deliciosos e densos. Intensos. Sempre pintados de uva. Sempre lindos. E os arrepios. Muitos arrepios. E ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. Muito feliz. Não existiam mais as más notícias. Não. Defitivamente não. Havia um aroma de uva no ar. Um perfume. E palavras sussuradas na dose certa. Na dose certa. E ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. E molhada. E o abraço que vinha depois era como um gatilho para uma boa noite. Toques. Reflexos. Seios.
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