Pular para o conteúdo principal
QUANDO A MELHOR OPÇÃO É ABRIR A JANELA E DEIXAR O CALOR SAIR...

E a noite estava quente. Muito quente. Tão fodidamente quente que ele mal conseguia pensar.

Mal conseguia pensar.

Mal conseguia pensar nos seus erros, mal conseguia pensar nos desejos, mal conseguia pensar em qualquer coisa que não fosse aquele maldito ar abafado, seco, sufocante e desesperador.

Mentira.

Grande mentira.

Uma mentira filha da puta.

Mais uma de suas mentiras.

Tão usuais e presentes na sua vida como a sua própria sombra. Mentiras tão presentes na sua vida como a nicotina, o ãlcool, os entorpecentes, a música e os erros.

Mentiras usuais e presentes.

Porra, e mesmo com todo aquele calor desesperador e cruel de Janeiro, óbvio que ele conseguia pensar direito em tudo o que havia feito, em todas as besteiras que havia dito e no grande erro que havia cometido. Mais um enorme erro dentro do infindável rol de besteiras que ilustrava sua vida.

- Você vai dizer apenas isto - ela perguntou, surpresa diante da porrada, surpresa diante da porrada verbal que havia tomado.
Ele ficou em silêncio e nada disse. Apenas concordou com a cabeça, como um idiota adolescente. Um idiota desarticulado e desvairado.
- Você é um imbecil, saca. Um tremendo imbecil. Um dos maiores imbecis que tive a infelicidade de conhecer. Um desgraçado e maldito imbecil que arruinou um bom pedaço da minha vida. E agora, cruel e sádico, vem e diz que tudo não passou de um grande erro. Um engano. Um engano. Um absoluto engano. Você é um tremendo de um filho da puta - vociferou, como se suas palavras fossem de estilhaços.
E foi embora para todo o sempre.


E depois de anos de beijos e transas e poesias e cartas de amor, certamente é por demais frustrante e decepcionante ouvir desta pessoa que foi - claro que foi - importante, que você é um tremendo de um filho da puta.

A imagem dela deixando o Clube Varsõvia e saindo apressada, deixando para trás as lágrimas e os seus cabelos cor de girassol, por um bom tempo marcará a lista de seus grandes erros.

Tudo porque ele teve medo.

Tudo porque ele teve muito medo.

Medo de ter medo e de mergulhar fundo demais.

Medo de ser um otãrio.

Medo de querer viver com a mesma pessoa pelo resto da sua vida.

Medo de ser uma pessoa normal.

Uma pessoa como todos nõs.

E enquanto estas cenas rodavam e rodavam a sua cabeça, como um torturante e penitente caleidoscõpio de dor e mea-culpas, ele lembrou o quão quente estava aquela noite.

Decidiu esquecer por um tempo, mas sem deixar o cerébro derreter.

Abriu a janela e deixou o vento entrar.

Ao menos de calor não iria morrer...

... apenas de dor.

Muita dor.

Como sempre!

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

OS PEQUENOS MILAGRES DE SÃO JORGE. PEQUENOS?

- Lembra? - ela perguntou, com um sorriso feliz. - Do que, exatamente? Ando bebendo tanto que minha memória dissolveu de vez - ele retrucou, divertido. - De quando nos conhecemos? Lembra? Ele sorriu por um tempão e ficou olhando para aquela garota linda, ao seu lado. Simplesmente a sua melhor amiga.A pessoa com quem ele mais se importava. - Lembra ou não, porra? - ela perguntou ríspida, exibindo a total falta de paciência. Típica. - Claro que lembro - ele respondeu - Claro que lembro. Clube Varsóvia e o Edu nos apresentou. - Sei. - Claro que sabe, você queria dar para ele. - Tonto. - Queria sim. - Imbecil. - Deixa isso para lá. O que você quer saber exatamente, tirando o porra do Edu? - ele perguntou, curioso com a pergunta. - Estávamos no Varsóvia e você me disse algo que achei tão curioso para o lugar, para o momento, para tudo o que acontecia naquela hora. - O quê? - ele perguntou - O que eu disse de tão formidável e extraordinário assim? - Falávamos sobre alguma c
POSSO PEDIR DESCULPAS? Eu vou atualizar isso aqui...estou no meio de uma tempestade de coisas para fazer e não tem sobrado muito tempo para fazer o que gosto...escrever, por exemplo...mas eu prometo escrever e amanhã, antes do carnaval, postar um conto sobre isso, inclusive, carnaval... Alguém espera?
POSSO NÃO DESISTIR? eu escrevo esse blog há quase sete meses. E não é fácil escrever estórias, desenterrar memórias, abrir segredos...e sabe o que recebo no e-mail? "Hey, sua média de visitas é tão baixa...você acha que alguém se interessa? Que alguém quer ler o que escreve? "...e eu preciso responder e pensar que sim. Não importa se é uma, duas ou três pessoas...quem perde um minuto do seu precioso dia entrando aqui é uma pessoa muito importante para mim...uma pessoa muito especial...porque quer saber o que escrevo e não há felicidade maior do que essa... obrigado...espero não desistir tão fácil assim...
E QUEM DISSE QUE AS COISAS NÃO PODEM SER ASSIM? APENAS SIMPLES... - Pára! Ela ouviu a frase e virou a cabeça rapidamente. Queria saber de quem era aquela voz doce e suave, porém firme e ligeira, que havia dito a tal palavra para ela. - Pára! Assim – ele repetiu. Ela encarou o dono da voz com uma certa irritação. Apenas para disfarçar. Ele era lindo. Olhos escuros, cabelos pretos longos, um queixo quase barbado, regular e quadrado, e um sorriso sensacional. Estimulante. Aparentemente sincero e interessante. Ela apenas o encarou em silêncio, agora sem qualquer irritação disfarçada. Ele sorriu simpático, querendo quebrar o gelo – A posição do seu rosto daria uma foto. Um retrato lindo, sabe? Por isso pedi, quer dizer, quase mandei, né? Você ficar parada. Queria congelar o momento. Ela segurou um sorriso, apenas para querer parecer ser um pouco mais teimosa. Um pouco mais difícil. Ele ofereceu uma bebida. - Não sei o que está bebendo – ela disse – Como posso aceitar? Ele continuou com o co
DANÇAS DE AMOR SEM TECHNICOLOR Eles dançavam. O espaço era pequeno, a sala do apartamento dele era extremamente tímida e o sofá, de tão puído, já nem existia mais. Ótimo - ele gostava de pensar - Assim sobra mais espaço para a dança . E era exatamente a dança que impregnava a sala naquela noite cheia de estrelas tristes e gente dizendo adeus. Enquanto isso, eles dançavam. Ritmo suave e doce, quente e confortável, como um vinho bom. O ruído dos calçados deslizando pelo piso da sala era insinuante e ritmado, constante e adocicado, um tango bom. E eles dançavam felizes. Felizes como há tempos não estavam, como crianças novas, descobrindo amor. Lá fora a cidade era pura madrugada e testemunha. Apaixonada. Era a própria noite veloz que sabia do seu fim, do seu destino triste, da sua morte prematura e repetitiva provocada pela manhã implacável que sempre insiste em nascer, para desespero dos boêmios, para desespero dos amantes, para desespero dos jovens e velhos, daqueles que sabem viver. M