Pular para o conteúdo principal
AONDE O MAR VIRA O CÉU...

- Então será mesmo dia 19? - ele perguntou, quase casual, quase indiferente.
Ela evitou olhar para ele. Disfarçou olhando o mar, longe longe, aonde o oceano vira o céu - Sim. Dia 19, ou seja, próximo sábado.
- Uma semana - ele lembrou, brincando com areia entre os dedos, desenhando nuvens e sonhos psicotrópicos.
- É - ela disse, lacônica e breve.
- Mas vai ser maravilhosos querida. Vai ser maravilhoso de verdade. Não acha? - ele perguntou, agora querendo apenas (auto)convencer de que ela estava certa, de que ela realmente estava fazendo o melhor, o correto.
Ela encarou os dedos finos dele deslizando na areia - Não sei. Não sei se vai ser maravilhoso. Mas sei que é o quero fazer. Quero mesmo dar um basta e sumir. Viver. Sei lá.
- Berlim. Berlim é longe não? - ele riu da própria besteira.
Ela sorriu, enquanto sentava na areia molhada ao lado dele - Longe pacas.
- E nós?
- Nós?
- É. Nós.
- Nós o quê? - ela respondeu querendo evitar aquela pergunta, querendo evitar dar qualquer tipo de resposta, querendo evitar qualquer coisa.
- Eu vou sentir sua falta - ele disparou, pouco se importando se ela queria evitar aquele assunto.
- Eu também, caralho. Você sabe, não sabe?
- Claro que sei. Claro que sei. Sei porque você está indo, sei o quanto batalhou por este ano que vai passar em Berlim, sei a grana que juntou, sei tudo. Mas isso, definitivamente, não impede que eu sinta muitas saudades.
- Podemos conversar pela internet. Passo em qualquer cybercafé e conversamos por mail, orkut, messenger, enfim, o que der e quando possível.
Ele sorriu, levantando-se e limpando a areia úmida - Já te falei que adoro praias em dias cinzas?
Ela sorriu como se fosse a primeira vez que estivessem juntos - Repetidas vezes - respondeu.
Enquanto ajudava ela a se levantar, ele comentou - Desde muito pequeno, quer dizer, adolescente, desde muito adolescente eu tinha um daqueles murais ridículos no quarto. Eu costumava colar fotos e letras de canções que eu escrevia, enfim, costuamava colocar toda espécie de bagulhos na porra do quadro, numa forma de memorabilia pessoal.
- E? - ela perguntou, curiosa.
- Vou "ressuscitar" este quadro para poder prender nele os seus e-mails - ele disse - Assim você fica lá, pregada na parede e na minha memória.
Ela sorriu um sorriso de despedida, um sorriso de amor, um sorriso de sábados cinzas em praias desertas - E eu vou no carro pegar um baseado para este nosso ritual de celebração e reencontros - Espera aí - ela pediu.

E enquanto ela caminhava em direção ao carro, ele apenas a observou, ali, parado com os pés afundados na areia molhada pela chuva da noite anterior. Seus olhos encheram de lágrimas e lembranças. Despedidas e partidas - E mais uma vez, tudo o que vai me restar são as memórias. As memórias e as lembranças do que jamais tive a porra da coragem para fazer. E mais uma vez, eu apenas vou dizer adeus e ouvir canções tristes. Tudo ainda mais uma maldita última vez.

E como foi o futuro?

E vocês ainda perguntam?

Basta imaginar uma canção antiga do Neil Young.

Aonde o céu o o mar se encontram...

... e também se separam... e também se separam...

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

NUCA

Ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. Muito feliz. Não existiam mais as más notícias. Não. Definitivamente não. Sem contas, protestos, cobranças ou ligações indesejadas. Nada. Nada a perturbar. Existiam apenas os lábios de Fernanda em sua nuca. Lábios deliciosos e densos. Intensos. Sempre pintados de uva. Sempre lindos. E os arrepios. Muitos arrepios. E ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. Muito feliz. Não existiam mais as más notícias. Não. Defitivamente não. Havia um aroma de uva no ar. Um perfume. E palavras sussuradas na dose certa. Na dose certa. E ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. E molhada. E o abraço que vinha depois era como um gatilho para uma boa noite. Toques. Reflexos. Seios. ...

Going Down

leia e ouça: lou reed || going down “... Time's not what it seems. It just seems longer, when you're lonely in this world. Everything, it seems, Would be brighter if your nights were spent with some girl Yeah, you're falling all around. Yeah, you're crashing upside down. Oh, oh, and you know you're going down For the last time …” Lou Reed || Going Down E o sonho avançava. Apenas avançava. A noite tinha apenas começado. … - Ei mocinha. Mocinha? Me ouve? Ela chacoalhou os cabelos castanhos desgrenhados, um monte de nós sem sentido, apenas ela, virou o rosto confuso e encarou aquele sujeito grande, intimidador, com cara de bravo e que estava imóvel à sua frente, um verdadeiro brusco naquele cenário. - Então, me ouve? Está me ouvindo? - aquele grandalhão insistiu - Me ouve, porra? - disse, de modo grosseiro. Ela olhou com um tanto de medo e sem saber exatamente o que fazer, o que dizer, o que mexer, o que responder, nada disse. Apenas, nada disse. - Você entende? É surd...

Quando Você Ama…

  leia e ouça: surf curse || freaks “...Don't kill me just help me run away From everyone I need a place to stay Where I can cover up my face Don't cry, I am just a freak I am just a freak I am just a freak I am just a freak…” (Surf Curse || Freaks) Quando você vive, você erra. Todos nós. Todos. Todos nós erramos, de um jeito ou de outro. Faz parte. Quem nunca errou? Quem nunca? Só quem não viveu. Quando você vive, você se expõe e acaba errando, cedo ou tarde. Mente quem diz que nunca errou, uma vez que certamente também errou em algum momento da vida e tenta negar isso. Eu? Se eu errei, omiti e menti? Sim. Certamente. Muito. Mais do que seria razoável, muito mais do que seria razoável. E só os Deuses sabem como foi difícil e errado e como me arrependo. Arrependimento? Muito. Arrependimento real e verdadeiro. Mas, a verdade é o mais importante. Sempre. E demorei a entender isso. Demorei MUITO. Muita porrada para entender isso. Muita porrada para entender isso. A transparência. ...
DISCOS DE VINIL NÃO SALVAM VIDAS? - Discos de vinil não salvam vidas - Bia sentenciou, profana e canalha Nanda abriu os olhos em choque - Não? Como não? - Não, porra. Definitivamente, discos de vinil ou fitas cassete ou ipods ou seja lá o diabo, não salvam vidas. Não. - Você enlouqueceu? - disse Nanda. Bia sorriu um sorriso sinistro, triste, inadequado à felicidade. Adequado ao seu momento. - Claro que salvam. Se você não desistir de se matar ao ouvir Marvin Gaye e Tammi Terrell juntos e cantando apaixonadamente, então não sei o que mais pode te ajudar. - Nhá. Isso é para você, ingênua e esperançosa. - Se eu me fodesse, não me afogaria em etanol barato. Me afogaria em lágrimas ao som de um bom soul dos 60s. Estaria salva. - Que patético. - Você precisa de um choque de realidade. Um choque de vida. Você precisa de cores. = Vai começar. Já te disse para parar - pediu Bia. - Parar nada. Você precisa mesmo. De vida, porra. - Pára de encher. Você está me irritando - disse Bia. - Eu preciso ...
O SECAR DAS LÁGRIMAS (É TÃO DOCE) "...it´s getting better all the time..." - Puca cantarolou do nada, para espanto de Lee. - Está? - Lee perguntou, completando na seqüência - E meu Deus, você vai sussurrar esta canção a tarde toda? - Claro que sim - Puca respondeu - Estou feliz, pô. Não vejo o menor problema em expressar isto. - Você é um saco. ...it´s getting better prá lá, it´s getting better prá lá. E peraí porra, isto é Beatles? Certo? - Lee perguntou fast and furious, após cair a ficha. Puca olhou com um ar fake de superioridade para a amiga e com um sorriso quase revelador, apenas assentiu com a cabeça. - Jesus, como você está ficando cafona, Puca - Lee reclamou - O que pode estar ficando melhor nesta porra de dia cinza? Ainda mais ao som de uma banda dos meus pais? - Como você é pesssimista Lee. Caráleo. Como você é pessimista. Você é uma garota tipicamente "quarta feira de cinzas". Um porre não, uma ressaca completa. Você sucks demais. Lee sorriu com a bri...