Pular para o conteúdo principal

FIOS DE SORRISOS.

Enquanto todos festejavam lá embaixo, ela entrou de mansinho no quarto dele.
Bem de mansinho, mais suave e leve do que a meia luz dos abajures vagabundos daquele quarto pudessem registrar.
Ele nem notou.
Leve e linda ao entrar naquele quarto grande e sem sal.
Quarto grande, bagunçado e completamente sem sal.
Sem vida e pessoas bonitas.
Um quarto.
Repleto de nada, pôsteres babacas e discos de vinil.
Vazio.
Vácuo de emoções.
E ele estava na cama.
Sentado e chorando.
Cabisbaixo. Bastante cabisbaixo.
Olhos vermelhos e fundos.
Apenas triste.
Ela sentou-se ao seu lado.
Ele percebeu e deixou.
Nada disse.
Ela afagou os cabelos curtos dele e disse com carinho, com muito carinho – Ei, seu bocó, é seu aniversário hoje. Estão todos festejando lá embaixo e você aqui? Virou prima dona agora? Depois de velho? Não vai ser anfitrião? Não quer? Virou babaca? – provocou.
Ele apenas a olhou com doçura com os seus olhos verdes, vermelhos e marejados. Nada disse.
Silêncio.
- Você acha que tem problemas, né? – ela perguntou, com uma certa dose de ironia, com uma certa dose de suavidade. Com uma grande dose de amor.
Ele não respondeu.
Silêncio.
- Sabe – ela prosseguiu – Você precisa pensar mais nas coisas, pensar mais na sua vida. Não pode ficar sentado em uma cama de um quarto, chorando como um babaca como se não houvesse amanhã. Hoje é seu aniversário caralho. Mude! – determinou.
Ele a encarou em desafio – E há? – perguntou – Há algum amanhã para babacas como eu? Que estragam tudo, que só fazem besteira? Há? – insistiu.
Ela sorriu e disse com carinho, muito carinho – Claro que há. Sempre há amanhã. Só não vê quem não quer. Lembra da música? "...a solidão é pretensão de quem fica, escondido, fazendo fita...". Pára de fazer fita idiota – completou.
Ele desviou o olhar para as sombras da meia luz idiota do abajur.
Ela, de forma rápida, passou as mãos em seus próprios cabelos e retirou rapidamente a sua peruca. Ficou nua para ele. Completa e totalmente nua.
Brincou com os poucos fios que estavam recomeçando a nascer e disse com um sorriso – Tá vendo? Eles crescem de novo. Estão crescendo. O tratamento não vai me matar. Ao contrário. Tudo renasce nesta vida. Tudo.
Ele a encarou com um amor jamais visto e a abraçou ternamente. Como irmãos, como amigos, como grandes amigos.
Ele nunca havia a visto assim depois do início do tratamento.
Percebeu o quão babaca era.
Chorou copiosamente.
Problemas?
Todos têm.
Resolvê-los?
Poucos sabem.
O final?
Desceram para a sala e a festa foi longe. Foi muito longe.
Repleta de risadas, piadas, amigos e coisas boas.
Como se não houvesse amanhã. Como se não houvesse amanhã.
Mas sempre há.
Sempre há.
Sempre...

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Luar || Penumbra || Sonho || Amor

leia e ouça: Sunset Rollercoaster - I Know You Know I Love You “ Watch the sky, you know I Like a star shining in your eyes Sometimes I wonder why Just wanna hold your hands And walk with you side by side I know you know I love you, baby I know you know I love you, baby ” (Sunset Rollercoaster - I Know You Know I Love You) Penumbra. Madrugada. 4:10 da manhã. Luz? Apenas a luz do luar combatendo as frestas da persiana mal fechada e que estava sofrendo bastante com as rajadas do vento cortante vindo ao seu encontro de forma incessante e dura. Sábado. Frente fria. Penumbra. Madrugada Amor. 4:13 da manhã. Luz? Apenas a dela. Do delicioso e escultural corpo. Dela. Aquele corpo nu ao seu lado, descoberto delicadamente e de forma não intencional pelos movimentos da noite. Linda. Sensual. Impecável. Escultura para os apaixonados. Como ele. E ele apenas a observava sob a luz do luar forte. Lua cheia. Lua cheia de amor, paixão, ímpeto, vontades, desejos, lua cheia. Lua cheia de vida. Lua cheia d...

Ela Gritou

leia e ouça || Echo And The Bunnymen || Back of Love “ I'm on the chopping block chopping off my stopping thought self doubt and selfism were the cheapest things i ever bought when you say it's love d'you mean the back of love when you say it's love d'you mean the back of love? ” Madrugada. Silêncio. Vida. Noite. Um cigarro aceso. Vários cigarros acesos. Um copo americano cheio de álcool. Vários copos. Lágrimas. Choro. Vida. Madrugada. Silêncio. Horas. Noite. Tudo. Tudo. Madrugada. Vida. Ela. E ela? Ela apenas gritou. E de forma tão alta e tão forte e em um tom nada brando, em ato de coragem, em gesto de desespero. Ela gritou. Ela apenas gritou. Imaginava ele no aeroporto indo embora. Naquela noite. Naquela maldita noite. Indo para uma viagem insana em países nórdicos desconhecidos. Ela chorou. Ela gritou. Tentou de tudo para ficar com ele. Tentou de tudo para ser feliz. Tudo. E foi. Foi MUITO feliz ao lado dele. Mas, agora, sobrou o cigarro aceso, o incenso queiman...

Going Down

leia e ouça: lou reed || going down “... Time's not what it seems. It just seems longer, when you're lonely in this world. Everything, it seems, Would be brighter if your nights were spent with some girl Yeah, you're falling all around. Yeah, you're crashing upside down. Oh, oh, and you know you're going down For the last time …” Lou Reed || Going Down E o sonho avançava. Apenas avançava. A noite tinha apenas começado. … - Ei mocinha. Mocinha? Me ouve? Ela chacoalhou os cabelos castanhos desgrenhados, um monte de nós sem sentido, apenas ela, virou o rosto confuso e encarou aquele sujeito grande, intimidador, com cara de bravo e que estava imóvel à sua frente, um verdadeiro brusco naquele cenário. - Então, me ouve? Está me ouvindo? - aquele grandalhão insistiu - Me ouve, porra? - disse, de modo grosseiro. Ela olhou com um tanto de medo e sem saber exatamente o que fazer, o que dizer, o que mexer, o que responder, nada disse. Apenas, nada disse. - Você entende? É surd...

Talvez

leia e ouça: Sinéad O'Connor || Love Letters   “ Love letters straight from you heart Keep us so near while apart I'm not alone in the night When I can have all the love that you write I memorize every line And I kiss the name that you sign, oh And darling then I read again Right from the start Love letters straight from your heart ” Talvez Talvez ser Talvez crescer Talvez nascer Talvez viver Talvez morrer Morrer? Não Talvez… Apenas talvez Talvez Talvez ser Madrugada Olhos da lua Cores fatigadas Talvez Talvez apenas ser Vida cruel que suga e é sugada Talvez Ser Talvez todo dia Talvez toda noite Talvez todo dia Talvez sorte  Talvez não Talvez má sorte Talvez não Talvez bom azar Talvez não Talvez tudo Talvez nada Talvez vida Talvez morte Talvez uma jornada Talvez Talvez necessário dizer  O que precisaria ser dito Talvez não manter Abafado este grito Talvez Talvez beleza Talvez tristeza Talvez grandeza  Talvez lerdeza Talvez vida Talvez não Talvez tudo Talvez nada ...

FIREWORKS

- Ai, que merda! - ela gritou, visivelmente irritada. - Tá louca? - ele respondeu, surpreso com o tom de voz dela. - Odeio esta música. DJ idiota - ela emendou - O Clube Varsóvia já foi melhor. Imbecil de escolher isto para o ano novo. - Você é louca? - ele perguntou, sério. - Não, porra, sou louca não. - Mas parece. Caralho. Há quanto tempo você vem no Varsóvia e NUNCA disse isso. O que há? Algum problema? - ele perguntou. Ela balançou a cabeça e seus olhos ficaram cheios de água - Nada - ela disse e confirmou - Nada. Não aconteceu porra nenhuma. - Como assim, nada? - ele questionou - Desde quando você fica transtornada assim? Por tão pouca coisa? Desde quando uma canção escolhida por um DJ idiota te tira do sério? - Nada, puta que o pariu. Nada. Pode ser? - ela disse, bastante brava. - Qual seu problema Lisa? Posso saber? Ela apenas abaixou a cabeça. - Me diz - ele insistiu. Ela ficou em silêncio por alguns instantes e emendou - Hoje é primeiro de Janeiro. Ele a olho...