Ela estava sentada com as pernas bem dobradas,
encostada junto à parede daquele quarto vagabundo do Hotel Varsóvia.
Debaixo da esquadria da janela da sala daquele
apartamento vagabundo em que estava hospedada.
Uma droga.
Uma porra de apartamento.
Ao menos sozinha.
Ao menos.
No escuro, sentada com as pernas bem dobradas,
quase com câimbras que sequer sentia, ela apenas via a sombra noir dos relâmpagos que davam as caras
lá fora, intermitentemente.
Uma droga.
Uma porra de apartamento.
Uma porra de Hotel Varsóvia.
Ao menos sozinha.
Acuada e assustada.
Acuada e assustada.
Bem, nada estranho.
Nada estranho.
Nada estranho vindo do seu cotidiano.
Acuada e assustada era apenas ela na sua melhor
forma.
Na sua pior forma.
Na forma de sempre.
Tola as usual.
E a chuva parecia ser despejada do céu pelos anjos
– Anjos? Que porra é essa? - através de enormes baldes. Enormes baldes,
repletos de água doce e ao mesmo tempo amarga.
Água das nuvens, dos rios, dos Alpes, de lágrimas e
de tudo o mais o que parecesse líquido.
Mas, ainda assim, o seu baseado insistia em
permanecer aceso preso entre os seus lábios.
Insistia amigavelmente em permanecer aceso.
Bom amigo.
Bom amigo.
Seu único e confidente amigo naquele momento.
E não havia luz no apartamento daquele hotel
vagabundo.
Nada.
Porra nenhuma.
Nem uma faísca de nada.
Mas... Ela não tinha medo do escuro.
Não.
Ela tinha medo dela mesmo.
Apenas isso.
Simples assim.
Não havia luz no apartamento.
Nada.
Porra nenhuma.
Nem uma faísca de nada.
Nada.
Mas... Ela não tinha medo do escuro.
Não.
Definitivamente não.
Ela tinha medo dela mesmo.
Escuro?
Corte de energia pelo não pagamento ou simples
queda em razão da chuva? Ela nem tinha idéia e isso pouco importava aquela
altura do campeonato, aquela altura dos acontecimentos.
Naquele momento pouco importava a porra da ausência
de luz. Pouco importava.
Mesmo.
Ela já não tinha dinheiro, telefone, carro, água e
a luz, diante de tal cenário de caos a falta de tudo era o menor dos seus
problemas. O menor dos seus problemas.
O que restava era proteger seu baseado, o pouco da
vodka barata que restava na cozinha e suas pílulas rosa.
Apenas isso.
Nada mais.
E a chuva parecia ser despejada do céu através de
enormes baldes. Enormes baldes, repletos de água doce e amarga. Água das
nuvens, dos rios, de lágrimas e de tudo o mais que fosse líquido.
E ela permanecia sentada com as pernas bem
dobradas, ainda encostada junto à esquadria da parede da sala.
Debaixo da esquadria da janela.
Debaixo da porra da esquadria com a foto dela entre
seus dedos e o baseado entre os seus lábios.
Queimando seus lábios.
Queimando seus lábios.
E seus dedos?
Dedos longos, finos e bem cuidados. Dedos de
pianista como dizia sua falecida avó.
Os seus dedos segurando a foto.
A foto delas.
No escuro, ela ainda continuava apenas a ver a
sombra noir dos relâmpagos nas paredes
e que davam as caras lá fora.
Acuada e assustada.
Acuada e assustada.
Mas ela não tinha medo do escuro.
Não.
Mas se deu conta da sua situação e chorou.
Chorou.
Como uma criança.
Totalmente infantil.
Totalmente Ela.
E debaixo da janela com todo aquele céu líquido
derretendo as estrelas e com a foto dela entre seus dedos e o baseado entre
seus lábios ela apenas desejou uma coisa...
Uma pequena coisa que faria toda a diferença...
... que ela estivesse por perto.
Que ela ainda estivesse por perto.
E que o céu não tivesse a afogado.
Não muito longe...
Não muito longe...
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