Pular para o conteúdo principal
ENCONTRANDO MOTIVOS PARA TER UM MOTIVO

Não havia sol, mas aquele finzinho de tarde estava quente e abafado como há tempos ele não lembrava. Apesar disso, de todo aquele calor de verão insuportável, não havia muitas pessoas na praia.

Estranho – ele pensou. Definitivamente, não havia quase ninguém curtindo a brisa do mar naquela tarde suada.

De qualquer forma, ele era uma destas poucas pessoas e, porra, ele estava muito feliz com isso.

O baseado estava no fim, quase queimando a ponta dos seus dedos. O cd, com as milhares de músicas em mp3 que ele havia baixado, também já estava acabando e o fone de ouvido começava a incomodar. A lata de cerveja jogada na areia, ao seu lado, já era passado há muito tempo. Ele percebeu que mais um dia estava acabando.

Não havia sol e a noite começava a querer invadir, de uma vez por todas, aquele cenário de final de tarde.

Ele sorriu, feliz da vida, lembrando da noite anterior e de tudo o que havia descoberto e sentiu uma imensa falta dela naquele momento. Naquele exato momento em que o seu baseado acabava, o dia morria e a cerveja não mais existia.

- Então? – ela disse
- Então, o quê? – ele respondeu, meio bobo, meio cínico
- Descobriu o que você quer, afinal de contas? – ela insistiu
Ele olhou para o canto da sala, assustado até a morte, com medo de encarar os seus frios e deliciosos olhos verdes e sentenciou, como num drama, como num filme, como num bolero rasgado e antigo, da pior espécie, da pior qualidade – Descobri, afinal, o que eu não quero – e manteve o suspense
- E vai me dizer? – ela perguntou
Ele olhou para a janela e disse – Como se você ainda não soubesse
Ela sorriu – É sempre bom ter certeza. Sempre bom
- Encontrei meus motivos – ele respondeu
- Motivos?
- Exato. Encontrei os meus motivos, as minhas razões. Mais perto do que eu pensava
- Você não tem noção de como eu gosto de ouvir isto. Como eu gosto de ouvir isto
- Para nunca mais deixar de sorrir ou chorar, para nunca mais deixar de ser feliz ou ser só, para nunca mais deixar de viver
Ela o encarou, com muito, mas muito amor mesmo.
- Let´s dance babe? – ele perguntou, brincando
Ela consentiu com a cabeça e esticou seus braços – Claro, meu cavalheiro. Claro que sim


Ele afastou as lembranças e ficou erguido, sentindo a areia escorrer entre seus dedos longos dos pés.

Olhou ao redor e deu um suspiro. Caralho, como ele estava feliz. Estava feliz como há tempos não podia estar.

Quando menos suspeitou, ele decidiu viver.

Boa escolha, diria o sol. Boa escolha...



I Found A Reason
(Velvet Underground)


"Pa papa papa papa
Pa papa papa papa
Pa papa papa papa
Pa papa papa papa
I found a reason to keep living
Oh and the reason, dear, is you
I found a reason to keep singing
Oh and the reason, dear, is you
Oh I do believe
If you don't like things you live
For some place you never gone before
Pa papa papa papa
Pa papa papa papa
Pa papa papa papa
Pa papa papa papa
Honey, I found a reason to keep living
And you know the reason, dear it's you
And I've walked down life's lonely highways
Hand in hand with myself
And I realized how many paths have crossed between us
Oh I do believe
You're all what you perceive
What come is better that what came before
Oh I do believe
You're all what you perceive
What come is better that what came before
Pa papa papa papa
Pa papa papa papa
Pa papa papa papa
Pa papa papa papa
And you'd better come, come come, come to me
Come come, come to me
pa papa papa pa
"

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

NUCA

Ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. Muito feliz. Não existiam mais as más notícias. Não. Definitivamente não. Sem contas, protestos, cobranças ou ligações indesejadas. Nada. Nada a perturbar. Existiam apenas os lábios de Fernanda em sua nuca. Lábios deliciosos e densos. Intensos. Sempre pintados de uva. Sempre lindos. E os arrepios. Muitos arrepios. E ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. Muito feliz. Não existiam mais as más notícias. Não. Defitivamente não. Havia um aroma de uva no ar. Um perfume. E palavras sussuradas na dose certa. Na dose certa. E ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. E molhada. E o abraço que vinha depois era como um gatilho para uma boa noite. Toques. Reflexos. Seios.

A SAÍDA É LOGO ALI

OUÇA: casino || ponte Ela pensou que seria possível esquecer os seus problemas. Todos os seus problemas. Todos. Ela realmente acreditou e pensou que seria fácil. Simples como tomar um destilado forte, bebericar um café sem açúcar ou descolar uma anfetamina qualquer. Acreditou que pudesse esquecer tudo e, para tanto, apenas alguns trocados no bolso e um carro bastaria. Um carro que a levasse para longe dali e pudesse fazê-la seguir em frente e rasgar todas as estradas possíveis, todos os caminhos reais ou mesmo imaginários. E assim ela fez. Em uma sexta-feira úmida e cinza - como os seus olhos aliás - ela acordou bem cedo. Era madrugada, quase manhã. Encheu a sua mochila gasta de tantas viagens com uma porção de maços de cigarro, alguns pendrives com as suas músicas prediletas, livros de poesia barata e, claro, fotos antigas. Fotos suas e de seus amigos. Fotos que ela adoraria ver, caso sentisse saudade. Ela detestava ver fotos digitais e aquele conjunto de fotos impressas era um tesour
LÁGRIMAS DE NEVE POR FAVOR, USE OS HEADPHONES (GENESIS – MORE FOOL ME) E lá estava ele naquele país estranho, com pessoas diferentes do seu mundo, que não falavam a sua língua e não entendiam o que ele sentia. E lá estava ele sozinho, como de hábito. Sozinho e em Varsóvia. Polônia. Em pleno começo de inverno e sentindo um frio quase igual ao da sua alma. Glacial. E ele mal lembrava como havia ido parar naquela gelada e distante cidade. O que começou como uma fuga, acabou virando a sua vida. Uma vida de estações de trem, cozinhas de restaurantes baratos, cigarros grosseiros, roupas sujas e desgastadas e pouco, bem pouco dinheiro. O destino final? A fria Varsóvia. Foda-se – ele pensou – Ao menos faço o que quero da vida. Só que sozinho. Sem ela. E em pleno inverno glacial. E naquela manhã, ao sair da cama, ele nem percebeu que a noite mal dormida foi apenas um prenúncio de que, após seis meses de fuga, o passado estava de volta para lhe encarar, lhe ferir, lhe machucar
QUANDO A CHANCE CAI DO CÉU (OU SEJA, NUNCA SE SABE) Ele entrou no quarto de forma rápida e desastrada, quase mortal, quase suicida, quase nada. Um trapalhão em um filme noir, um filme escuro, filme antigo, filme preto e branco, filme brutal, um filme odioso, o filme da sua vida. Mas, tanto faz, ele detestava cinema. De qualquer forma, ele entrou cambaleando no seu quarto, como se os pés fossem disformes e o precipício, logo ali. Estava completamente molhado pela tempestade que caía lá fora. Molhado da cabeça aos pés. E bêbado. Ele estava bêbado. Totalmente chapado. Bêbado como um idiota. Um imbecil que, como de hábito, havia feito tudo errado. Sempre e sempre e sempre tudo errado. Caiu assim que a porta abriu. Não conseguiu chegar até a cama desarrumada e desabou, sentindo o gosto do assoalho sujo de poeira e de bitucas de cigarros mal fumados. Não se moveu. Aquele gosto era bem melhor do que aquele que pairava em seus lábios desde o começo da madrugada. Comformou-se em estar no chão.