Pular para o conteúdo principal

COMO SE FOSSE FÁCIL ENTENDER...

Ele estava lá, parado, naquela sala fria, olhando a maldita carta devidamente pousada sobre o aparelho de som. Ele chegou e a carta já estava lá. Quieta. Com certeza colocada naquela posição por Dona Francisca, a faxineira da vizinha que, de vez em quando, fazia uns favores para ele e arrumava algumas coisas no seu apartamento. E a carta estava lá. E ele ficou absolutamente surpreso ao ver a mesma. Não esperava que ela enfim chegasse um dia. Não esperava, por mais que a desejasse ardentemente. Por isso ele estava aflito. Queria e não queria abrir a porra daquela carta. Sabia que o seu conteúdo seria triste. Muito triste. Por isso mesmo ele desejava ter força suficiente para não abri-la. Acendeu um cigarro e ficou lá, parado, imaginando como era imaturo e tolo e cretino por não conseguir abrir uma carta enviada por alguém que ele queria tão bem. Alguém que ele queria muito bem. Mas, no fundo, ele não era imaturo e tolo e cretino. Ele era apenas uma pessoa com medo naquele momento e isso não é, ao menos não deveria ser, motivo para ele se sentir fraco e pequeno e frágil. Ele apenas estava com medo de ter a certeza sobre o que ele, no fundo, já desconfiava. Quem nunca se sentiu assim? Quem nunca se sentiu assim?
O fato é que depois de horas ele acendeu um último cigarro encorajador e abriu a droga da carta com raiva, como se o papel e aquele envelope de cor cinza fossem os responsáveis por toda aquela angústia. Ele abriu a carta e pôs-se a correr os olhos sobre as letras manuscritas de forma avessa. Pôs-se a correr e a correr e a correr os seus olhos e, ao final das últimas palavras, os mesmos estavam afogando em lágrimas. Afogando em lágrimas. E ele deu um grito que possivelmente acordou toda a vizinhança.

...mas não chorem por ele. Ele fez o que deveria desde o início. Encontrou o espelho, antes que fosse tarde demais para mudar o que ele refletia. Antes que fosse tarde demais.



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

NUCA

Ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. Muito feliz. Não existiam mais as más notícias. Não. Definitivamente não. Sem contas, protestos, cobranças ou ligações indesejadas. Nada. Nada a perturbar. Existiam apenas os lábios de Fernanda em sua nuca. Lábios deliciosos e densos. Intensos. Sempre pintados de uva. Sempre lindos. E os arrepios. Muitos arrepios. E ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. Muito feliz. Não existiam mais as más notícias. Não. Defitivamente não. Havia um aroma de uva no ar. Um perfume. E palavras sussuradas na dose certa. Na dose certa. E ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. E molhada. E o abraço que vinha depois era como um gatilho para uma boa noite. Toques. Reflexos. Seios.
E QUEM DISSE QUE AS COISAS NÃO PODEM SER ASSIM? APENAS SIMPLES... - Pára! Ela ouviu a frase e virou a cabeça rapidamente. Queria saber de quem era aquela voz doce e suave, porém firme e ligeira, que havia dito a tal palavra para ela. - Pára! Assim – ele repetiu. Ela encarou o dono da voz com uma certa irritação. Apenas para disfarçar. Ele era lindo. Olhos escuros, cabelos pretos longos, um queixo quase barbado, regular e quadrado, e um sorriso sensacional. Estimulante. Aparentemente sincero e interessante. Ela apenas o encarou em silêncio, agora sem qualquer irritação disfarçada. Ele sorriu simpático, querendo quebrar o gelo – A posição do seu rosto daria uma foto. Um retrato lindo, sabe? Por isso pedi, quer dizer, quase mandei, né? Você ficar parada. Queria congelar o momento. Ela segurou um sorriso, apenas para querer parecer ser um pouco mais teimosa. Um pouco mais difícil. Ele ofereceu uma bebida. - Não sei o que está bebendo – ela disse – Como posso aceitar? Ele continuou com o co

Brindando Palavras Repetidas

  leia e ouça: richard hawley || coles corner - Você é repetitivo. Ele a olhou com uma surpresa muda,  - Você é muito repetitivo - ela disse, certeira, sabendo que o havia atingido em seu ponto mais fraco, mais vulnerável, mais dolorido. Não sorriu. Ele a olhou com certa surpresa sabendo que, no fundo, ela estava certa - Como assim? - perguntou, querendo ter certeza. - Repetitivo. Repetitivo. Você usa as palavras de forma inconsequente e repete sempre as mesmas coisas. Faz isso o tempo todo. - Faço? - ele disfarçou. Ela então sorriu levemente - Claro que faz. Mas o que me deixa ainda mais fascinada é esta sua cara de pau. Você sabe que é assim, desse modo, desse jeito e ainda assim continua nesta direção. Ele fingiu indignação, mas por puro orgulho. Ela estava absolutamente certa. Ele tomou um gole do que estava bebendo e ficou quieto, esperando a próxima porrada. - Não? Você não sabe disso? - ela insistiu. - Talvez - admitiu, sem admitir. - Então, por que você não tenta mudar? - Você