Pular para o conteúdo principal
QUAL O MOMENTO CERTO DE ERRAR?

Eles estavam cansados, andando na praia, andando exatamente no melhor lugar do mundo em que se pode estar às cinco e meia da manhã de um dia de verão: no lugar em que as ondas morrem na areia, no lugar em que as ondas terminam a sua deliciosa viagem, no lugar em que as ondas alcançam, finalmente, o seu grande objetivo.

Beira-mar...

- Você não vai acreditar – ela desafiou, sem graça.
- Se você me contar, quem sabe eu consiga – ele retrucou, jogando fora a ponta final que segurava do seu baseado babado.
- Na areia não, sua besta – ela gritou, tipo mãe – Joga essa porra no lixo.
Ele fez uma cara de irritado e apenas resmungou qualquer coisa, enquanto corria em direção a uma cesta de lixo, perto de um bar.

Voltou correndo e disse, quase sem ar – Pronto. Pronto, minha querida Sofia, seu desejo de uma praia limpa já foi atendido, pode continuar o que estava tentando me dizer – ele sorriu.
Ela respirou fundo e pareceu estar escolhendo as palavras – Talvez, pela primeira vez em toda a minha vida, eu creio que estou verdadeiramente apaixonada por alguém – disparou, como se tivesse confessado um crime, uma chacina, um ato de terrorismo.
Ele parou de andar por um instante e a encarou, sério, porém tentando disfarçar.
- É – ela prosseguiu – Talvez meu ritmo não seja muito rápido, não sei, talvez meu espírito não seja dos mais apaixonados, mas o fato é que mesmo demorando, finalmente estou sentindo “essa coisa”, sabe?
- Sei – ele disse, baixo – Vai me dizer quem é o felizardo?
Ela olhou para o mar azul, lindo, que agora, com o sol começando a nascer, estava absolutamente entorpecente.
- Não vai me dizer? – ele insistiu, angustiado.
Ela, sem desviar os seus olhos do mar de verão, perguntou – Você não sabe ou é apenas uma vingança por eu ter te dado aquele fora de “amigo” há uns bons anos?
Ele ficou em silêncio, com o estômago amordaçado, como se tivesse sido nocauteado em cheio no meio do rosto.
- Você não sabe? – ela disse, ainda mais uma vez, agora esquecendo o mar, o lúdico mar azul.

Ele se aproximou e deu um beijo impressionista naquela garota diante dele, um beijo molhado, sensual, amargurado, apaixonado, sufocado, estranho...


E enquanto se beijavam, com o verão de testemunha, ela simplesmente pensou – Sempre é tempo, que bom, que bom...
E enquanto se beijavam, com o céu de testemunha, ele simplesmente pensou – Não te amo mais Sofia... e agora? O que vai ser de mim?


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

ODEIE-ME DOMINATRIX Alguém já viu olhos verdes tão gordos e lindos? Ela era fatal. Uma inebriante Femme Fatale como a canção de Lou Reed e seu underground de veludo. Absolutamente fatal. Fatal e forte e firme e segura e decidida e atrevida e ousada e centrada e todos os demais adjetivos utilizados sem vírgula entre eles. Adjetivos verdeiramente adjetivos. E exatos. Ela era fatal e simplesmente o ignorava. Culpa dele? Claro que sim. Idiota ao extremo, não percebeu que, na verdade, além dos saltos agulha e do corselet preto e do chicote prateado, havia uma garota de olhos gordos e verdes com medo. Insegura e menina demais. Insegura e menina demais para ser deixada de lado. Ele não percebeu. Só isso. Pobre idiota, covarde e medroso. Azar o dele. Agora é tarde para arrependimentos e desculpas. Agora é tarde demais. E nos guardanapos de papel escritos à mão por ele em madrugadas frias e úmidas e bêbadas, repousava a sua culpa e o seu desejo. Não me ignore. Odeie-me dominatrix. E apenas os t

VOYEUR DE TRENS TRISTES

Ela não tinha carro. Definitivamente não. Nada. Carro nenhum. Nada. Ela não tinha carro e dependia apenas das suas próprias pernas para andar. Apenas dela e das suas longas pernas. Só transporte público. E ruim. Péssimo transporte público. Ela dependia dele e andava em trem, ônibus, táxi, bicicleta, a pé, de um lado para outro por toda a cidade. De um lado para outro. Por toda a cidade. E nas suas viagens loucas , longas e insuportáveis, ao invés de ficar como uma idiota no fone de ouvido e num celular vagabundo ela apenas observava. A tudo e a todas as situações. Observava a tudo e a todos com a maior esperteza, com a maior atenção. Esperta. Nada de malditos fones de ouvidos brancos e joguinhos sem graça. Nada de música ruim nos headphones. Nada de música ruim. Nunca. Nem jogos idiotas. Ela gostava de observar. E era boa nisso. Muito. Ela parecia boba. Mas não era. Longe disso. Muito longe disso. Boba nunca. Nunca. Ela era muito, muito,
COMO UMA CANÇÃO DE LAURYN HILL Então, ela se pergunta, o que aconteceu com todos aqueles momentos? Alguém pode explicar? Alguém pode explicar para essa menina doce, gentil e bem humorada, de que serviu todo aquele amor, aquele desespero, aquela vontade insana e adolescente de querer ficar junto, de querer estar junto, de querer comer junto, viver junto, enfim, morrer junto? Aquele desejo doentio e saudável de viver duas únicas vidas em uma só? Alguém pode explicar essa porra? Porquê, até onde eu sei, não existe um manual de instruções de como proceder em caso de falência múltipla de sentimentos. Não, meu caros amigos, definitivamente não há um manual de instruções que possa ajudar-nos a entender todas as razões sem razão, todos os desejos sem recíproca, todas as cores do universo. Não, mas nem fodendo. As brigas, os momentos de raiva, o medo, desespero, a vontade de fugir, enfim, todos os desequilíbrios da mente não vem com um pequenino, um simples, um maldito manual de instruções. E e

SONHOS DE UMA MADRUGADA MOLHADA DE VERÃO

- Sonha comigo? – ele pediu quase tolo, quase infantil. - O quê? – ela respondeu – Pirou? O calor derreteu o pouco que resta do seu cérebro pequeno? – disse irônica. - Sonha comigo? Sonha? – ele pediu. - Como assim “sonha comigo”? Você acha que eu escolho os devaneios que tenho durante a madrugada? Acha que consigo selecionar com o que vou sonhar? – ironizou. - Talvez. Se você quiser muito, pode até conseguir. Quem sabe? Ela sorriu e fez um carinho fofo em seus cabelos curtos. Admirou seus olhos verdes e apenas sorriu. - Por favor? – ele insistiu – Você me disse que sonhou comigo outra noite. Porra, quem sabe consegue repetir a façanha. Vou ficar muito feliz. Muito mesmo. - Você é um idiota de verdade – ela disse com carinho. - Mas não basta sonhar. Tem que me contar os detalhes depois – ele afirmou como um babaca apaixonado. - Vou tentar. Prometo que vou tentar. Antes de tomar o meu Lexotan e dormir como um anjo, vou mentalizar muito para ter um sonho cont