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POR FAVOR, RETORNE A LIGAÇÃO.


- Clarice? Clarice? – ele perguntou, em um baixo tom de voz. Ela não abriu os olhos. Parecia dormir um sono profundo. Sequer se moveu.
- Clá? Clarice. Pode falar? – ele insistiu em um tom baixo, após desistir na sequência. Ela continuou dormindo. Como se não houvesse amanhã. Como se não houvesse nada além do sono e de um sonho bom. Ele pegou o telefone e respondeu
– Oi, Bruno? É Bruno, né? – ele perguntou ao telefone. Com a resposta positiva do outro lado da linha, ele prosseguiu – A Clarice não pode atender agora. Pode ligar mais tarde?
A voz irritada do outro lado da linha o deixou puto. Extremamente puto.
- Olha meu caro, ela não pode falar agora. Impossível. Se quiser, ligue mais tarde. Se não quiser, problema não é meu, ok? Foda-se – completou, batendo o telefone na cara do otário do outro lado da linha.
Voltou para a sala e ficou observando aquela garota linda deitada no seu sofá. Não acreditou. Caso não gostasse de garotos, certeza que a amaria eternamente. Cabelos da cor de um girassol. Lindos. Amarelos como o sol. Ela era linda. Traços maravilhosos de beleza em um rosto tão sofrido de fúria e desencontros. Ele fez um carinho no seu rosto. De leve. Com cuidado. Não queria a acordar. Ele a adorava. Pena que ela exagerava na bebida e nos aditivos. O telefone tocou novamente.
- Alô – ele disse, sem paciência.
- Alô. Bom dia, por favor a Clarice? – a voz do outro lado da linha emendou direto.
Ele suspirou, com o saco cheio, e respondeu – Ela não pode falar nesta exato momento. Quem deseja?
- Márcio. Aqui é o Márcio. Posso deixar um recado?
Ele olhou para o alto e respondeu, sem nenhuma paciência – Claro. Pode falar.
- Peça para a Clarice, por favor, que assim que ela puder, que ela ligue para mim. É urgente, muito urgente – ele pediu, meio humilde e muito sem jeito – Meu nome é Márcio.
- Ok. Eu dou o recado Márcio, mas posso te fazer uma pergunta?
- Claro.
- Qual a razão da urgência? Posso ajudar?
Após alguns instantes de silêncio, ele disse, tranquilo – Desculpa, eu não te conheço, mas você já amou alguém?
- Como?
- Isto mesmo. Você já amou alguém? - Márcio perguntou, simples, simplório, simplista.
- Já. Claro que já amei alguém.
- Então você vai entender. Eu fiz algo muito errado ontem. Muito errado mesmo.
- Com a Clarice? – perguntou.
- Claro. Com a Clarice. E eu preciso muito falar com ela.
- Ok. Pode deixar que eu dou o recado.
- Valeu – e desligou o telefone.
Ele desligou o telefone, se virou e encarou, mais uma vez, o rosto angelical e lindo de Clarice. Deu um breve sorriso e acendeu um cigarro. No final das contas, entre desculpas e mentiras e erros, quem diria, o amor ainda iria prevalecer.
O amor ainda iria prevalecer.
Mais uma vez...

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NUCA

Ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. Muito feliz. Não existiam mais as más notícias. Não. Definitivamente não. Sem contas, protestos, cobranças ou ligações indesejadas. Nada. Nada a perturbar. Existiam apenas os lábios de Fernanda em sua nuca. Lábios deliciosos e densos. Intensos. Sempre pintados de uva. Sempre lindos. E os arrepios. Muitos arrepios. E ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. Muito feliz. Não existiam mais as más notícias. Não. Defitivamente não. Havia um aroma de uva no ar. Um perfume. E palavras sussuradas na dose certa. Na dose certa. E ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. E molhada. E o abraço que vinha depois era como um gatilho para uma boa noite. Toques. Reflexos. Seios.
APENAS RELÂMPAGOS... O beijo que você me deu sob o sol A chuva molhando os campos de maçã (Sob o Sol - Vibrosensores) Lembro que choveu MUITO naquela tarde. Muito mesmo. Mais do seria normal em qualquer outro dia, em qualquer outro dia que não aquele. Maldito. Tudo estava bem, mas o céu, como puro capricho, decidiu se rebelar. O céu, assim de repente, tornou-se cinza. Absurdamente cinza. Cinza chumbo, quase noite. E choveu muito mesmo naquela tarde. Como jamais eu pensei que poderia chover em qualquer outro dia normal. Em qualquer outro dia que não aquele. Maldito. Lembro-me que eu estava no parque central, quieto, pensando nas verdades que eu havia ouvido e arquitetando uma fuga mirabolante do viciado e repetitivo labirinto caótico que a minha vida havia se transformado. Lembro-me que não estava sol, nem tampouco abafado, e que, portanto, não havia tantas nuvens no céu capazes de provocar aquela tempestade. Não mesmo. Mas, ainda assim tudo aconteceu. Não me dei conta, e,