Pular para o conteúdo principal

RETRATOS ANTIGOS ou BRIGADEIROS E BLOGS


Brigadeiro Tradicional
Ingredientes:
1 lata leite condensado
1 colher de margarina
2 colheres de chocolate em pó
Modo
de preparo:
Misturar tudo, levar ao fogo e ir mexendo até aparecer o fundo da panela. Pronto!
Depois de frio, é só enrolar e passar no chocolate granulado.


...

Ela tinha várias paixões na vida. Os brigadeiros, as suas músicas, os seus contos e muito mais.

Muito mais.

Mais do que qualquer outra coisa, comer doces, beber e escrever era o que realmente a fazia feliz, satisfeita, alegre, enfim, viva, numa espécie de delicioso alive and kicking particular.

Os brigadeiros ela amava desde que se entendia por gente. De qualquer tipo ou forma, cor ou recheio. Tais doces serviam como uma espécie de inspiração ao que ela escrevia. Preparava os seus próprios conforme receita de Letícia, amiga do colégio, cuja mãe trabalhava em uma doceira perto de onde estudavam. Era uma fórmula simples. Fabulosa. Até ela, uma completa nula na arte culinária, era capaz de prepará-los, sem maiores dificuldades.

Os contos, bem, os contos eram o seu mundo, a sua real vida, a sua forma mais peculiar de expressão. Não conseguia demonstrar os seus sentimentos de forma tão segura que não escrevendo. Talvez essa fosse a principal razão dos seus incontáveis fracassos amorosos. Um após o outro. Um após o outro. Desencontros de informação.

As canções?

Ela amava. Guitarras altas e acordes desafinados. Baterias tresloucadas.

Ela sempre pensava como é curioso ninguém ter uma fórmula para sexo e relacionamentos, assim como existem fórmulas e mais fórmulas para se fazer brigadeiros e música, por exemplo.

E era sempre assim.

- Porque está me convidando? Eu mal te conheço – ele perguntou surpreso, na sempre lotada cantina da faculdade.
- Ora, vamos. O show será bom. Você não me é tão desconhecido assim. Estudamos na mesma turma. Sei o seu nome, sei que adora café com creme e sei que esta é uma das suas bandas prediletas. É um bom começo, não é? – ela perguntou ainda incrédula com a sua inédita iniciativa.
- Tem razão. É que eu não estou mesmo acostumado com tamanha gentileza – respondeu com um sorriso, tentando não parecer arrogante.
- Na pior das hipóteses – ela completou – se o show não for bom, podemos tomar uma bebida depois. Nem tudo pode ser perdido
- Está bem. Encontramos aonde?
- Tem uma padaria na esquina do lugar e podemos nos encontrar lá meia hora antes do show, que tal? - ela sugeriu, torcendo para que ele não percebesse o nada ligeiro tremor no canto de sua boca.
- Certíssimo - ele concordou.
- Perfeito. A gente se vê, então.
- Até mais.

Despediram-se com um leve beijo no rosto. Quando ele não estava mais ao alcance do seu olhar ela quase chorou. Estava absolutamente feliz por ter, depois de um milhão de planejamentos, tido a coragem de se aproximar e convidá-lo sem parecer muito idiota.

Meia hora antes do show, lá estava ela sentada junto ao balcão daquela apertada padaria, linda, maquiada e com os cabelos levemente desarrumados, fumando um cigarro após o outro e tomando goles descompassados de uma cerveja barata qualquer. Sentia-se como o próprio Lou Reed à espera do seu homem.

Só que ele não veio. Dez, vinte, vinte e cinco, trinta, quarenta, cinquenta, oitenta minutos se passaram e ele, simplesmente, não veio. A padaria já estava completamentre vazia. Todas as poucas pessoas já haviam entrado no show que, a esta altura, já deveria estar na sua metade.

Ela pagou pelas cervejas e entrou direto no primeiro táxi que encontrou. Riu como uma insana, apesar dos olhos profundos, quando percebeu que o taxista estava com o rádio ligado ouvindo Heaven Knows I´m Miserable Now, dos Smiths. Achou a situação tão inimaginável que se pôs a rir e a rir e a rir.

In my life, why do I give valuable time, to people who don´t care if I live or die...

Assim que entrou em casa foi direto em encontro a geladeira. Ela já sabia que iria escrever muito durante a noite. Muito mesmo. Pegou vários doces. Preferia ficar em silêncio, escrevendo e se inspirando, com seus brigadeiros e seus blogs. Somente com seus brigadeiros e seus blogs.

E os retratos?

Apenas guardados.

Apenas guardados e na memória dela.

Bem guardados.

Bem guardados ...



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

NUCA

Ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. Muito feliz. Não existiam mais as más notícias. Não. Definitivamente não. Sem contas, protestos, cobranças ou ligações indesejadas. Nada. Nada a perturbar. Existiam apenas os lábios de Fernanda em sua nuca. Lábios deliciosos e densos. Intensos. Sempre pintados de uva. Sempre lindos. E os arrepios. Muitos arrepios. E ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. Muito feliz. Não existiam mais as más notícias. Não. Defitivamente não. Havia um aroma de uva no ar. Um perfume. E palavras sussuradas na dose certa. Na dose certa. E ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. E molhada. E o abraço que vinha depois era como um gatilho para uma boa noite. Toques. Reflexos. Seios.
DETESTANDO SÁBADOS, DOMINGOS, SEGUNDAS, TERÇAS... POR FAVOR, USE OS HEADPHONES (TORI AMOS – I DON´T LIKE MONDAYS) Ele estava sem muito saco naquela noite de sábado, mas, ainda assim, graças à insistência deles, resolveu sair com os seus amigos para beber, dançar, conversar, fumar, enfim, viver uma típica noite de sábado como faz todo ser humano que está...vivo. E, ainda que não fosse esse exatamente o seu caso, lá foi ele, mais uma vez, ao Clube Varsóvia, para sentar e fumar um Marlboro atrás do outro, enquanto os seus amigos dançavam e se embriagavam. E enquanto a música preenchia o ambiente de modo devastador e o álcool começava a cumprir o seu papel de desinibidor supremo, ele fez exatamente como a sua mente solitária havia, cruel e repetidamente, planejado antes da chegada dos seus amigos. Ficou prostrado em uma cadeira nada confortável do Varsóvia, ouvindo o som e apenas olhando a diversão, como se ela não lhe fosse jamais permitida. Mas o acaso conspira. Entre

TO THE END

- O que vc quer de mim? – ela perguntou, aos gritos – Que porra você quer de mim?. Ele olhou para o chão, triste. Não queria responder, não sabia responder. Preferiu o silêncio. - Vai responder, seu filho da puta? Vai? – ela gritou, enquanto dava socos no peito dele. Socos não fortes, porém socos repletos de raiva, desespero e dor. Ele ficou em silêncio. Ficou em total e absoluto silêncio, sem ter nada a dizer. Ela ter visto aquele beijo já era o suficiente. - Seu idiota. Seu completo e estúpido idiota. Sai daqui. Agora! – ela gritou. E ele saiu do pequeno apartamento e foi embora, descendo as curtas escadas daquele prédio tão antigo. E enquanto descia, podia ouvir, com desespero, o choro e a dor daquela garota tão especial, outrora o grande amor da sua vida. E caiu em choro e lamento. Pobre diabo...